segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Desafios

Continuo pensando em entrega, zona de conforto e em saudades. Talvez esses tópicos sempre façam parte da minha vida morando fora do meu país. Ainda fico impressionada em quão contraditórios são os sentimentos e como somos feitos de contradições. Até hoje não acredito que tive coragem o suficiente para ir embora. Pensando friamente, é como se houvesse uma força me empurrando e me obrigando a seguir. Seguir para que? Eu não fazia a menor ideia.

Falando em contradições, como posso sentir tanta saudades do meu conforto e proteção familiar e ao mesmo tempo não querer voltar? Como posso sentir que um lugar é minha casa ao mesmo tempo em que sinto que não é?

Talvez essas dúvidas me acompanhem para sempre. A verdade é que nós pensamos demais, seria mais facil deixar a vida simplesmente seguir em frente. Mas morando tão longe isso me parece impossível. A vida aqui não cansa de ser intensa, de apresentar desafios e mudanças. É como se ela me dissesse: você gosta de desafios? Temos novos para você. 

Eu estava entrando novamente na minha zona de conforto e, ah, quão confortável ela era! Os meus colegas de trabalho pareciam minha familia, nos encontrávamos nos finais de semana, viajamos juntos, compartilhávamos a vida. Pensei: " mesmo fora do meu país encontrei pessoas que me fazem sentir em casa". Você acha que fiquei nesse emprego? Não.

Mas aí vem aquela força de novo, que da mesma maneira que me moveu até aqui, me moveu até o próximo desafio. Aquela mesma que me fez ser forte o suficiente para deixar o meu país, me fez ser forte para deixar o meu tão sonhado e confortável emprego. É quase um vício por desafios.

Com isso chegou o emprego novo, que na primeira semana já jogou a minha zona de conforto para quilômetros luz de mim e me mandou para um outro país para ser treinada pela nova equipe. Nunca me senti tão feliz, tão empolgada, tão orgulhosa de mim mesma e tão desesperada. E nisso volto ao tema contradições - como é possivel reunir todos esses sentimentos em um só ser humano?

Voltei dos USA, mais forte, destemida, corajosa, e mais uma vez, desesperada. Era hora de encarar o emprego, as pessoas novas e o inglês, que enquanto no outro emprego era um assunto resolvido - virou novamente um pesadelo. Era como se tivesse acabado de chegar no país. Coração acelerado, suor frio para falar com as pessoas. Tudo de novo! Mas eu posso reclamar? Não, a escolha foi minha. 

Nisso mais um mês de total desconforto se passou. O desconforto continua, mas talvez hoje consiga controlar o coração que acelera toda vez que preciso me comunicar.
Assim, sem nenhuma conclusão do porque somos/sou invadida por esses sentimentos e por essa sede de mudança, me pergunto se isso acontece só comigo ou se é algo natural do ser humano.

Por que o sentimento de insatisfação é tão presente e ao mesmo tempo tão necessário para seguirmos em frente?


segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Entrega

Essa é apenas uma maneira de deixar as palavras emergirem da alma sem censura, para que elas possam traduzir de alguma maneira o que se passa internamente.
Não há um objetivo além de simplesmente expressar o que está guardado, o que por si só já é suficientemente nobre.

É porque quando se vive intensamente e se entrega verdadeiramente a vida, a necessidade de guardar momentos e de externar aprendizados começa a surgir, o que nada mais é do que um processo natural de compartilhar e dividir. Não há como negar que o ato de "escrever" se torna uma solução óbvia quando se pensa, por exemplo, em eternizar sentimentos.

Talvez essa seja também uma maneira de estar mais perto dos entes queridos, ou talvez seja uma necessidade de ser compreendida, ou pode ser simplesmente porque a alegria deve ser compartilhada para que seja completa (e a tristeza para que seja curada).

E quando se fala em escrever se fala também em entrega, em deixar as palavras fluírem naturalmente. É como fazer um desabafo tão profundo quanto bem elaborado.
Falo sobre entrega porque esse foi um dos meus últimos aprendizados e por ainda estar latejando na minha cabeça.

Quando me mudei de país sabia que eu deveria me "entregar" às novas experiencias, não havia como ser diferente. O conceito é simples, principalmente quando vem recheado de novidades em um lugar belíssimo. Mas o ser humano tem aquela forte tendência ao controle, de mapear todas as possíveis dificuldades como quem busca incessantemente pela sua zona de conforto. Chega a ser quase um desespero para tornar o desconforto em conforto, como se após esse processo pudéssemos respirar aliviados novamente.


É aí onde mora o aprendizado, em se jogar fora da zona de conforto de olhos fechados, permitindo sentir medo e descobrindo como se lida com ele. É se entregar ao novo país, a nova cultura, a nova língua, é errar, acertar, errar de novo e aprender a rir dos erros. Esse é o processo, essa é a entrega, aí mora o crescimento.